WordPress em português: pré ou pós-AO90?

pharmacia-formosinhoÉ uma discussão intensa há já algum tempo no seio da equipa de tradução portuguesa do WordPress, adotar ou não o Acordo Ortográfico para a Língua Portuguesa (AO90). Dessa discussão destacam-se dois consensos alargados: a oposição quase unânime ao AO90 e uma enorme resistência em aplicá-lo ao WordPress pt-PT.

Todavia, houve um entendimento geral de que se deveria avançar para a adoção do AO90; apesar de toda a discussão sobre a sua aplicação, o AO90 está em vigor e existem instruções para que as instituições públicas o apliquem. Além disso, há já muitas outras entidades privadas que o estão a fazer, criando uma necessidade de que a plataforma acompanhe o uso que lhe é dado (e exigido).


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Pessoalmente sou contra o AO90 mas, enquanto tradutor do WordPress, a favor da sua adoção na versão portuguesa. Não partilho do otimismo daqueles que acreditam que vai haver uma reviravolta espetacular e que regressemos à ortografia tradicional. Espero, contudo, que as notícias do atraso na sua adoção no Brasil signifiquem que possa haver uma revisão (que é urgente) do AO90, que corrija pelo menos as situações mais caricatas e incoerentes, para não dizer simplesmente estúpidas. Por outro lado, começa a ser muito difícil a coexistência de dois modos de escrita, de tradução, de revisão – a atividade profissional exige-me obediência ao AO90, a minha resistência pessoal vai atrasando a familiaridade com a nova ortografia. Resumindo, uma esquizofrenia totalmente dispensável.

No entretanto, parece óbvio que o mais sensato e prático é que a versão portuguesa de Portugal ofereça a quem a quiser usar uma ortografia conforme às disposições oficiais.

Formal ou informal?

Esta discussão tem tido lugar em paralelo com uma outra, relativa ao uso de uma versão informal do WordPress, i.e., tu em vez de você. Há já algum tempo que vimos mantendo uma versão informal em língua portuguesa no repositório de traduções do WordPress, muito graças ao esforço do Nuno Barreiro, mas a gestão de versões alternativas, além da energia adicional necessária, é uma dispersão de recursos que gostaríamos de canalizar para melhorar uma única versão e para manter a atualização tão rápida e eficiente quanto temos conseguido nas últimas releases.

A versão informal diferencia-se da formal sobretudo no backend do WordPress, onde poderá conseguir-se uma familiaridade positiva com o utilizador e traduzir melhor a experiência descontraída de usar o WordPress.

Creio que não errarei muito se disser que, também neste caso, a inclinação geral é para a adoção do tu. Mas, como se tratam de mudanças muito significativas, gostaríamos de as colocar, tanto quanto possível, à consideração da comunidade portuguesa.

E a seguir?

As implicações do resultado desta discussão são:

  • Esta comunidade, como até agora, trabalha apenas sobre uma única versão oficial da tradução, ou seja, aquela que for escolhida pela maioria;
  • As atualizações automáticas de versões do WordPress usam essa versão, única e exclusivamente;
  • Quem preferir continuar a usar outras versões, “não oficiais”, pode faze-lo à mesma – tal como o próprio WordPress, também as traduções são licenciadas por GPL e estão à disposição de todos, incluindo na plataforma de tradução;
  • É importante sublinhar que a manutenção e coordenação do esforço de tradução dessas versões é uma tarefa de quem lhe quiser tomar as rédeas (nós ajudamos) – ou seja, esta comunidade não irá fazer a sua gestão.

Que vos parece?

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40 pensamentos sobre “WordPress em português: pré ou pós-AO90?

  1. Não percebo como podeis afirmar uma “oposição quase unânime” ao AO90 para, logo de seguida, decidir adoptá-lo com base em razões frustes e contraditórias. O AO90 não é um facto consumado! O AO90 seria facto consumado se todos baixássemos os braços, como vós pareceis querer fazer. Reitero: o AO90 não é facto consumado! Se vos opondes ao AO90, o vosso dever é ajudar a combatê-lo, recusando aplicá-lo na WordPress. Podeis não acreditar que vá haver uma reviravolta, mas eu e muitos acreditamos. Enquanto entidade privada, não sois obrigados a seguir o AO90, ainda para mais quando nos encontramos em fase de transição que durará até 2016. Como sabereis, a maioria da população portuguesa é contra o dito, pelo que se quereis “que a plataforma acompanhe o uso que lhe é dado”, mantê-la-eis na ortografia decorrente da COLB45/73, a legítima, actual e adequada grafia do português euro-afro-asiático. Se sois contra o AO90, recusai aplicá-lo: ajudareis, assim, a derrubá-lo.

  2. Não é verdade que o AO90 esteja em vigor: Angola e Moçambique não o assinaram (e já deram a entender que não o vão assinar), o Brasil já disse que o quer rever, e a imposição deste acordo pelo governo é considerada anticonstitucional poe vários especialistas. Várias instituições já se manifestaram contra: a SPA, o Pen Club, o CCB, etc. Um juiz de Viana do Castelo proibiu a sua utilização no tribunal, para além da existência de movimentos de cidadãos junto da Provedoria de Justiça no sentido de impedir a sua aplicação. O AO90 é já um cadáver pouco agradável, e considero que quem se decide pela sua utilização se humilha a si próprio.

  3. Estar contra o Acordo Ortográfico não tem nada a ver com a imagem que foi colocada neste artigo. Não tem nada a ver com formas antigas de escrever, mas sim com a defesa da nossa língua (tanto escrita como falada). A evolução da língua não é feita por decreto e sobretudo nunca através de estudos pouco credíveis, por decisões políticas pouco ou mesmo nada transparentes. A força da língua portuguesa está na sua diversidade e não na sua unicidade. Brasil fala brasileiro (nuance do português), Angola fala angolano (nuance do português), Moçambique fala em moçambicano (nuance do português), etc etc.
    O português é falado e escrito de forma bem diferente do português brasileiro. Usamos construções frásicas distintas e pronunciamos as palavras igualmente de forma diferente.
    Adoptar o Ao é perder a nossa identidade, o resultado do AO é uma mixordia escrita, não é carne e nem é peixe.

  4. Olá,

    Eu acho que deveriam manter duas versões distintas da tradução PT, porque há muita muita gente que despreza o AO90 e que vai ver nessa adopção (mais) uma manobra de imposição da língua “por decreto”. Parece que, aos poucos, vão todos sucumbindo.

    Também acho curioso o facto de se referirem a “entidades privadas” em vez de “utilizadores”, como parte da justificação. Afinal, quem conta mais?

    Por fim, se de facto avançarem para adoptar o AO90, terei todo o prazer em pegar no ficheiro de traduções e criar uma versão que a comunidade possa usar sem ter que se sujeitar a uma língua que se pretende que seja imposta aos seus falantes. Eu não desisto de lutar pelas minhas convicções.

    _ miguel
    http://www.miguellaginha.com/desacordo_ortografico/

    1. Estás a esquecer-te de um pequeno pormenor

      …Eu acho que deveriam

      “Deveriamos” porquê? Tu excluis-te disso porquê? O trabalho que fazemos não é pago por ninguém, fazemos, como sempre fizémos, por amor à camisola. O problema é precisamente não termos recursos para gerir n variantes de traduções (isto sem falar do facto que as actaulizações automáticas do WordPress, só suportam uma, seja ela qual for).

      Seja o que for que a maioria decida, será implementado; que eu saiba não existe outra maneira de resolver a questão. Vai haver quem não está de acordo com a decisão final, é certo, mas por isso mesmo está no artigo:

      Quem preferir continuar a usar outras versões, “não oficiais”, pode faze-lo à mesma – tal como o próprio WordPress, também as traduções são licenciadas por GPL e estão à disposição de todos…

      1. Se a plataforma suporta apenas uma, que seja a pré. Até ao dia em que por razões legais ou de sobrevivência sejam obrigados a usar o AO90, muito gostaria de vos ver resistir ao Aborto Ortográfico. Não deixarei de pugnar pela grafia que me foi ensinada até que sobrevenha uma actualização que a adapte aos tempos, sem que a altere (ou seja, uma actualzação que reflicta a língua que já existe e não uma lei que tente pôr os portugueses a falar de forma diferente). A lógica subjacente ao Acordo está errada. Não temos de combinar nada com os outros palradores de português, nem eles connosco. Cada fala o que fala e nenhuma das formas tem de ser alterada para se adaptar a outra.

  5. Então, vamos a ver se percebi…

    Verificaram-se «dois consensos alargados: a oposição quase unânime ao AO90 e uma enorme resistência em aplicá-lo ao WordPress pt-PT.»

    Porém, «houve um entendimento geral de que se deveria avançar para a adoPção do AO90.»

    Pois, não percebo…

    … A não ser que se considere que, porque o «AO90 está em vigor», se deve… entender que a «oposição quase unânime» e a «enorme resistência» são inúteis, negligenciáveis… descartáveis.

    O problema principal desta lógica é que o AO90 não está, de facto, em vigor: externamente (afinal, é um «acordo» internacional), não foi ratificado por todos os países signatários, condição indispensável à sua aplicação efectiva; internamente, a sua aplicação resulta de uma resolução que, juridicamente, é inferior a um decreto (de 1945), que, esse sim, continua em vigor; mais, há um período de transição, que dá ao «acordês» um carácter provisório; e no parlamento está a funcionar um grupo de trabalho sobre o dito cujo, que tem vindo a proceder a audiências, e que irá formular conclusões e recomendações.

    Que eu saiba, o WordPress Portugal é, continua a ser, uma entidade privada… não foi «nacionalizada» pelo Estado. E, mesmo que fosse pública, nenhuma obrigação teria, como demonstrado acima, de respeitar e utilizar a aberração ilegal, inútil e ridícula que é o AO90.

    Espero, pois, que a «oposição quase unânime» e a «enorme resistência» demonstradas pelos utilizadores portugueses do WordPress (no qual eu me incluo… sim, também votei contra) sejam respeitadas… e que nesta plataforma se continue a utilizar o Português Normal e CorreCto.

  6. «dois consensos alargados: a oposição quase unânime ao AO90 e uma enorme resistência em aplicá-lo ao WordPress pt-PT»

    Como será que dois consensos alargados contra resultam num entendimento geral a favor?

    A aplicação cega do acordo ortográfico (cuja legalidade é duvidosa) mesmo por aqueles que lhe são contrários apenas irá reforçar a posição dos que o defendem quando se tentar reverter o processo, com a desculpa de que é facto consumado.

  7. Parabéns pelo exemplo acabado de cretinice. Ninguém concorda com o AO90, mas como você acha que sim, que se lixe a opinião dos outros.

  8. Para quê adoptar um “Acordo” que aumenta as diferenças entre as formas dominantes de Português? Antes do AO90, havia 3260 palavras que se escreviam de forma diferente; com o AO90, esse número aumenta para 3926.
    Mas faz algum sentido isso???
    Tenham juízo e mandem o Ao para o lixo, sff.

  9. @Jorge Teixeira, não percebo porque é que não lhe é possível discutir um assunto sem recorrer ao insulto, mas imagino que essa seja a regra dos comentários online hoje em dia. Parabéns por seguir o rebanho.

    Quanto ao “que se lixe a opinião dos outros”, imagino que não tenha lido o artigo todo (uma prática também ela muito popular), particularmente a parte onde está dito claramente que é precisamente da opinião de todos que necessitamos.

  10. Acho a vossa posição a mais correta. Estou bastante cansado de discussões sobre um assunto que, sendo polémico, não é merecedor de tanta exaltação, e que está a revelar que ignorância e xenofobia andam de mãos dadas.
    Apliquemos, pois, a grafia do AO90, como dantes aplicámos outras regras, gostando ou não. E, naturalmente, lutemos para o melhorar.

  11. 99% de acordo com o acordo ortográfico! (por exemplo, a frase “niguém para o Benfica” não faz grande sentido quando o Benfica está imparável, mas lá tivémos o Porto para dar a lição de ortografia, eheh..)

    Vá, brincadeiras à parte, para mim, DEFINITIVAMENTE com acordo ortográfico de 1990 e com tratamento informal (tu)

    Tenho tido tremendas experiências com outros scripts que traduzi à ‘unha’ e o modo “informal” definitivamente aproxima muito mais as pessoas.

    Sobre o acordo: a lei há muito que foi aprovada, portanto, está MESMO dentro da legalidade. Se os outros países os retificam mais cedo ou mais tarde, é mesmo e apenas uma questão de tempo.

    E se exemplos faltassem, basta verificar a imprensa: 90% da imprensa (TV, jornais, etc.) já tem o acordo de 1990 implementado.

    Resistir é futil. Melhorar é necessário. Sugerir é imperativo. Aceitar é obrigatório.

    1. A lei aprovada (e nem tem precedência sobre o decreto lei que rege o AO45, uma vez que é apenas uma resolução do conselho de ministros e não um decreto lei, logo não o substitui) não obriga ninguém fora do Estado a escrever em tamanha enormidade que é o AO90. Resistir é obrigatório e aceitar é opcional. Se uma RCM nos obrigasse a todos a usar uma estrelinha amarela na lapela também seria obrigatório aceitar? As leis descabidas devem ser mudadas e não aceites sem espírito crítico.

      1. Apoiadíssimo e escrito com o verdadeiro entender de um jurista, num verdadeiro Estado Social de Direito (embora haja uns e outros que não sabem o que isso é). O AO é material e formalmente ilegal.

  12. Quanto querem apostar que o Brasil se vai voltar a “esquecer” de aplicar o Aborto?
    Em 2015, logo veremos. Seja como for, interessa a alguém um suposto “acordo” que aumenta as diferenças entre as formas de Português escrito? E a nós, portugueses? Interessa uma coisa que apenas vai fazer com que o nosso idioma comece a ser grafado com a ortografia do Brasil? Começo a ficar cansado de corrigir “fato” para “facto” e “contato” para “contacto”. As pessoas – e as ferramentas de correcção ortográfica parece que apenas usam as formas ortográficas aplicadas pela maioria: as do Brasil… E além disso, porra! Eu digo EgiPto e não “égito”, entre mais um monte de anormalidades, pensadas por meia-dúzia de acéfalos de ambos os lado do Atlântico. Por isso, contra o AO, sempre e até às últimas consequências!

    1. Olá Pedro… eu sei que a adoção do AO é muito polémica, mas infelizmente o discurso à volta deste tema está cheio de incorreções anedóticas como as que acabaste de referir.

      As palavras “facto” e “contacto” estão consagradas como tendo dupla grafia no novo acordo, *precisamente* porque a consoante “c” é claramente pronunciada. Não há lugar à sua remoção.

      > Os dicionários da língua portuguesa, que passarão a registar as duas formas
      > em todos os casos de dupla grafia, esclarecerão, tanto quanto possível, sobre
      > o alcance geográfico e social desta oscilação de pronúncia.
      > — http://www.priberam.pt/docs/AcOrtog90.pdf (secção 4.4)

      Por exemplo, no dicionário online da Priberam pode-se ver que todos os exemplos que indicaste informam qual a grafia que se adequa a que pronúncia.

      Noutros caso a consoante é muda e não se pronuncia na expressão oral, daí ser removida *precisamente* para refletir a forma como se lê e evitar a sua memorização fortuita.

      Quem não se lembra de, em criança, reclamar das formas “estúpidas” de escrever certas palavras que “não faziam sentido”… pois, mas agora já as aprendemos, crescemos, e dá trabalho mudar! 🙂

      Não sou nenhum linguista ou especialista de Português, nem quero com isto dizer que o AO não tenha problemas ou coisas confusas, mas confesso que me chateia ver sempre os mesmo exemplos anedóticos (mas incorretos) virem à baila, em vez de argumentos em linha com o que *efetivamente* está escrito no acordo.


      Hugo

      PS: Este comentário está escrito sob o AO… Foi assim tão difícil de ler? 🙂

      PS2: Reparaste na palavra “adoção” logo na primeira linha? 😉 Não faz mais sentido escrevê-la assim?

      1. Por acaso reparei no “adoção” e a minha primeira ideia foi a de que deve derivar do verbo adoçar, tornar mais doce, mas talvez conjugado na terceira pessoa do plural e mal escrito. Nunca o associo a adoptar. O p pode parecer mudo e nalguns casos há quem não o pronuncie, mas ele está lá. “Efetivamente” também me é impossível ler de acordo com qualquer regra de pronúncia baseada na ortografia, pelo menos em Portugal, pois o que se pode pronunciar sem se empinar que as palavras que antes tinham consoantes mudas para lhes abrir as vogais, é uma coisa só feita de vogais fechadas que soará como ef’tivamente.

        Quem conhece as palavras com as consoantes mudas, mesmo que leia uma palavra nova saberá que as vogais que as antecedem têm de ser abertas. Ponham-se agora na pele de quem não sabe para que servem essas consoantes e ler uma palavra pertencente à lista das de pronúncia irregular, isto é, as que depois do AO90 foram mutiladas, e lerá a palavra erradamente. Quem aposta que factura daqui a uns anos, se a loucura persistir, não se passará a pronunciar normalmente como fâtura?

        Quem abre todas as vogais, como os Brasileiros, estranha as consoantes mudas. Quem as fecha por sistema, como os Portugueses, precisa delas para que a ortografia se aproxime da fonética – embora este seja exactamente o argumento usado para as suprimir com o AO90. Se a consoante dita muda (que não o é, mas quase) ajuda a melhor pronunciar a palavra, porque se há-de cortá-la.

        Adicionalmente, as palavras facto e contacto admitem grafias duplas, mas mantém a actual grafia em cada um dos países. Em Portugal continuam a ser facto e contacto.

        O que mais me impressiona é que os acorditas defendem o AO90 repetindo cegamente argumentos que se revelam falaciosos e acusam os que lhe apontam falhas de querer obrigá-los a escrever como não querem. E o inverso não é verdade? Não nos querem obrigar a escrever como não queremos? Não nos querem obrigar a escrever segundo regras pouco claras e que provocam deriva na própria fonética que dizem querer preservar? Tal como em muitos outros casos, os defensores de dogmas são os menos informados e os menos capazes de refutar argumentos sólidos. O AO90 uniformiza a língua escrita? Não. O AO90 acaba com as diferentes ortografias em Portugal e no Brasil? Não. O AO90 ajuda a pronunciar correctamente as vogais abertas que não as tónicas? Não. O AO90 torna a interpretação da ortografia menos dependente do contexto? Não. O AO90 serve para alguma coisa que o AO45 não servisse? Não.

        O AO45 tem palavras com pronúncia irregular ou que dependam do contexto? Sim, tem. São mais do que as do AO90? Não, de longe. O AO45 é perfeito? Não, longe disso, mas é menos imperfeito que o AO90. Ninguém gosta de passar de cavalo para burro, muito menos se tiver escolha.

        Para quem acha que tudo se resolve com o conversor automático deixo um desafio. Procurem converter um texto em que as palavras que antes não o eram passaram a ser homógrafas e reparem que não é possível passar de AO90 para AO45. Um verdadeiro acordo ortográfico, se o quiserem mesmo defender, não pode aumentar a confusão e obrigar a maiores dependências de contexto do que aquele que se propõe substituir.

        Um exemplo que aqui já foi referido foi o da frase “E ninguém pára o Benfica”. Convertam-no de AO45 para AO90 e depois procedam à operação inversa. O conteúdo mantém-se? Há correctores e conversores que saibam o que é contexto?

        1. Olá Afonso, não querendo mesmo entrar em polémicas, porque discutir o AO hoje em dia é equiparável a discussões sobre religião e futebol 🙂 (i.e. muito carregadas emocionalmente), e também porque não conheço o suficiente para ser agora o paladino da sua defesa, a minha opinião é que no fundo de tudo, a causa raiz de todo a controvérsia, é a nossa inerente resistência à mundança.

          Aquilo que aprendemos, como o aprendemos, e o que já nos habituámos, torna-se de tal forma património individual e uma referência para cada um, que mexer nisso é sempre polémico, criticado e rejeitado veementemente.

          Sempre! 🙂 Se até em coisas triviais como alterações no layout do Facebook a reação é o que é, quanto mais quando o que está em causa é a nossa língua e a forma como o nosso cérebro a percebe na forma escrita.

          Diz-se que “burro velho não aprende línguas” mas não é por ser burro, é por já ser velho 😀

          As palavras precisam de consoantes mudas para lhes abrir as vogais e não as termos de empinar, mas depois vivemos diáriamente sem problemas a fechá-las na “actualidade” e nas “actrizes” (mas curiosamente não nos “actores”).

          Parar ou não parar o Benfica é um problema (a meu ver uma construção de strawman ou “falácia do espantalho”, dada a remoção de contexto) mas depois temos outras palavras também passíveis de criar construções ambíguas, com as quais crescemos, e que na prática vivemos sem problemas: pega (ê|é), este (ê|é), cor (ô|ó), etc.

          1. Hugo fui eu quem escreveu aí a “célebre” frase “Ninguém para o Benfica” (que realmente se aplica para quando não existir treinador / jogadores para a equipa, como também dá para dizer quando a equipa está ali a 200 à hora a ganhar tudo… (creio ser a única falha que me recordo em que posso “apontar o dedo ao AO”)

            Mas sou defensor do AO!

            Portanto, só posso concordar (também) a 200% contigo!

            Aqui há uns tempos ouvia um grande professor sul americano (mas a lecionar em Espanha) que dizia acerca dos portugueses:
            “São como os pinheiros! Quando criam raízes, dali ninguém os tira!”

            Que grande verdade…

          2. A questão não é a aversão à mudança, mas sim ao não querer andar de cavalo para burro. É certo que o AO45 tem também algumas palavras homógrafas que não são homófonas, mas o novo vem piorar a situação. E é de relembrar que a maioria das palavras que se tornaram homógrafas com o AO45 se deveu a uma tentativa de aproximação da ortografia brasileira (a História repete-se).

            Se no acordo ainda em vigor, o AO45, sabemos que, salvo honrosas excepções, as vogais são fechadas excepto quando antes de c ou p, ou nas palavras que, sendo acentuadas, perdem o acento quando sufixadas com -inho ou -mente, agora temos vogais que se abrem ou fecham de acordo com a tradição – a tradição que advém da consoante dita muda. Quem fala brasileiro não tem qualquer problema, pois abre todas as vogais.

            Quem me explica a diferença de pronúncia, com uma regra simples e em Português europeu, entre dedicação e acção? E agora entre dedicação e ação? É esta a grande diferença entre AO45 e AO90. Regras com algumas excepções e não listas de excepções e cada um que se desamerde.

            Alguém acredita que o AO90 vai trazer a paz no mundo? Que o mercado brasileiro se vai abrir de par em par às editoras, tradutores e revisores?

            Quem não viu já legendas portuguesas que supostamente são em acordita, mas afinal, desde a construção frásica até aos termos usados são em brasileiro? Traziam o carimbo AO90.

  13. A Porto Editora tem uma ferramenta muito interessante que permite converter palavras conforme a ortografia antiga para a nova grafia e assim esclarecer logo qualquer dúvida sobre o acordo: http://www.portoeditora.pt/acordo-ortografico/conversor-texto/

    Por curiosidade, aproveitei e fiz upload para análise e conversão de todo o texto desta página, incluíndo o artigo e todos os comentários.

    Resultado? 99,4% de tudo o que se escreveu aqui até agora está em linha com o novo acordo ortográfico!

    Apenas 16 palavras em 2623 teriam que ser convertidas, e tudo casos relativos a consantes mudas, que de qualquer forma já não se leem.

    Não acham caricato tanta discussão e emoção (digo em geral, não aqui neste post) por tão pouco?


    Hugo

  14. Se efectivamente “factos” continuarem a ser “factos” e não “fatos”, então estamos perante um não-problema uma vez que o dito acordo ortográfico não teve impacto, os seus efeitos são não-existentes e ele não existe à luz dessa palavra. O problema coloca-se (a ter que se colocar) nas ocasiões em que ele tem um impacto efectivo. E sobre isso, haveria, penso eu, umas quantas coisas a apontar que nada têm a haver com uma resistência supérflua à mudança (como se mandar-mo-nos às cegas para ela fosse qualitativamente melhor). Por entre as coisas a apontar deveríamos começar – ironia das ironias – justamente pela palavra “facto”. Se a palavra “facto” preservar o seu “c” porque dele é feita pronuncia, então conserva-se uma matriz etimológica que as demais palavras (ex.: ação) não terão. Um sistema – qualquer que ele seja, ainda que ortográfico – só o será e só subsistirá enquanto for coerente, consistente e lógico consigo próprio (ou seja, enquanto as suas várias formas de manifestação forem suficientemente estáveis para poderem ser explicáveis ao leigo). Ora, como explicar a um aluno que na língua latina – língua que por ventura aprenderá – há um “c” mas que, em português, algumas palavras guardam esse cunho, mas a maioria não? Por outro lado, se no futuro o “c” de “facto” deixar de ser lido, como determinar a lógica por detrás da ortografia das palavras? Esta é a primeira questão (onde nem se quer menciono a labiríntica questão dos acentos).

    Deixando de lado as origens que o português tem numa língua morta, a segunda questão está também no facto de que as línguas vivas, tanto latinas (francês: “action”; espanhol: “accion”) como não latinas (inglês: “action”; alemão: “aktion”), continuarão a preservar esse cunho ortográfico quando o português, até nisso, afasta-se da sua familiaridade e da sua família. A única língua que não tem “c”, é o italiano que tem um sistema teleológico próprio (os dois “c” foram sistematicamente substituídos por “z” – é coerente, consistente, lógico em si).

    Terceiro problema está que, na eventualidade dos “c” não se lerem, foi um descuido popular que se instalou. Eu não devo baixar os standards ortográficos de uma língua para me adaptar aos erros orais da história, mas devo antes procurar corrigir essa diferença de standards (a menos que decida ser protagonista de uma progressiva degradação linguistica).

    Em quarto lugar, eu tenho alguma repulsa pela harmonização das coisas que faz tábua raza das diferenças culturais. O inglês torna-se língua mundial (quando haverá línguas mais ricas) e transporta orgulhosamente o justo fardo de “novilingua” com os seus good e god, evil e devil, any-one, any-body, network, etc… – http://pt.m.wikipedia.org/wiki/Novil%C3%ADngua; a economia mundialisa-se roubando poder politico localizado (logo poder democrático). A musica, os filmes, a cultura harmoniza-se, americanizando-se, achinezando-se ou ajaponizando-se. Desaparece a pluri-diversidade e o mutuo enriquecimento cultural. Se hoje há “fado” – não que aprecie – não foram e não podiam ser os americanos a criá-lo dado que ele é filho de determinadas condições socio-economico-territoriais. E, no entanto, o fado não deixa por isso de ser menos (ou mais) valioso que os demais estilos. Aliás, pergunto-me: que “c” retirar ao estilo musical que é o fado para o tornar mais “britney spears” ou mais “madonna”? Do mesmo modo, haverá uma verdadeira necessidade e será saudável homogeneizar o português oriundo de culturas diferentes?

    Em quinto lugar, as mudanças levadas por agentes políticos – especialmente aquelas que ocorrem sem consulta democrática – são normalmente condicionadas por interesses económicos (ex.: não pagar a dois tradutores para fazer o texto em português e em “brasileiro”; não fazer duas versões de um mesmo livro). Entre as grandes editoras brasileiras e as portuguesas quem sobreviverá, pergunto eu. Acaso não se saiba as novas bíblias, deixaram de ser “portuguesas” mas são exclusivamente “brasileiras”. Novamente, não é algo que me apraze.

    Em sexto lugar, devem ser mencionadas as famosas confusões que a mudança vai causar. Não deixa de haver verdadeiras parvoíces que não devem ser descuradas (antes, realçadas – já que elas não existem hoje) e que, por si só, atestam a inconsistência do sistema. De cágado a cagado vai uma grande volta. No entanto, o cágado passa mesmo a ser um cagado e daqui só sai uma grande cagada. Em último lugar mas não menos importante, é curioso ver Angola não querer ratificar o acordo e Portugal a ser mais papista que o Papa fazendo pressão no sentido de acatar as suas regras. Fá-lo como se o pacto em questão fosse já vinculativo antes mesmo de todas as partes o terem ratificado e de ele entrar em vigor – http://www.publico.pt/cultura/noticia/angola-diz-que-ratificacao-depende-de-questoes-tecnicas-1540312.

    E depois, na esteira das entidades estatais, há uma certa conformidade, bem conhecida dos portugueses, que se manifesta por uma resignação, uma aceitação, um deixar andar. Não por acaso – porque nada é por acaso – o País encontra-se face a desafios económicos e sociais sem precedentes: poucos foram sendo aqueles que denunciavam e trabalhavam no sentido de alterar o curso das coisas. Posso enganar-me mas o Alvaro Góis nunca foi uma franca oposição ao AO isto porque, mesmo nos seus artigos, já vem reflectido o dito acordo. Ora, um tão grande facilíssimo não pode ser revelador de grande oposição. Daí a dissonância cognitiva presente no texto entre a “oposição ao AO” e o “entendimento geral para adoptar o AO”…

  15. Só há qualidade se houver NORMA e se a mesma é cumprida. A condução automóvel tem uma norma (código de estrada). Se cumprirmos o código de estrada, garantidamente, haverá qualidade na condução automóvel. A Língua Portuguesa tem uma norma (gráfica e oral) que, para que tenha qualidade, deverá ser cumprida. O brasileiro nunca respeitou a Língua Portuguesa, quer quanto à escrita, quer quanto à oralidade. Para ele, acentua todas as sílabas, desrespeitando as regras da oralidade…

    Ele escreve “escola” e lê “éscólá”. Ele escreve “Barceló” e lê “Bárcéló”. Testem isso com qualquer brasileiro…

    Nós angolanos não adoptámos o AO porque preferimos escrever ou falar calão do que escrever ou falar mal o português!

    1. Totalmente de acordo. Neste caso, parece que se adaptam as regras a quem não sabe conduzir. Se se perdem as consoantes com valor diacrítico (que só na variante brasileira são mudas), ninguém perceberá que regras guiam as diferentes entoações de nação e acção, coação e coacção, óptico e ótico. E talvez devido à grafia que vamos vendo, haja cada vez mais gente a pronunciar actriz a rimar com cicatriz.

  16. Uma curiosidade para quem acha que a alteração da ortografia retira cariz à língua. Peguemos no planeta “Neptuno”.

    O seu nome provém da personagem mitológica inventada para conceber um deus da água e dos mares na religião romana, “Neptuno”.

    Cá em Portugal falamos e escrevemos “Neptuno” (com a letra ‘p’ antes da letra ‘t’) porque esse letra é efetivamente vocalizada.

    No Brasil, escrevem “Netuno” (sem a letra ‘p’) porque é assim que vocalizam a palavra.

    Na Itália, país onde outrora se falava, escrevia e se comandava metade do mundo *em latim*, escreve-se “Nettuno”. (não há ali nenhum ‘p’ – caiu porque deixou de ser vocalizado!)

    Agora peguemos na origem etimológica da palavra em latim: “Neptunus”.
    Tem a letra ‘p’ antes da letra ‘t’.

    Mas os italianos retiraram-na!

    Ah pois é…

    Mas não deixam de ser tão italianos como sempre foram só por causa deste facto. (e de tantos outro semelhantes que poderiam aqui ser também referidos e dados como exemplo)

    Porque é que nós os portugueses é que temos que sentir que, só a nós é que isto irá ser mau como o veneno das cobras…?

    1. O italiano moderno data do fim do século XIX e a ortografia adaptada foi a de denominador comum para todos os dialectos (que ainda subsistem por toda a Itália) poderem escrever em italiano. Até então, o italiano não existia. Havia o Calabrês, o Siciliano, o Napolitano, o Milanês, etc.

      O italiano não é exemplo de regra ortográfica para ninguém.

        1. Conclui-se então que o objectivo do AO90 não é arranjar uma nova ortografia para o português, mas sim estabelecer uma ortografia para uma nova língua.

          Voltando ao italiano. Os italianos não falavam (nem escreviam) italiano. Arranjou-se uma solução de compromisso a partir do vazio. O italiano moderno é um esperanto da península itálica.

          1. O acordo ortográfico de 1990 começou torto e muitos querem vê-lo morto o quanto antes, em vez de proporem soluções de compromisso para o melhorar.

            Da minha parte, viva ou morra, só digo isto: Entendam-se.

            Não me interessa para que foi feito. Interessa-me poder ter uma forma funcional de conseguir ter dois sites para organismos públicos conforme o que me é pedido: texto seguindo a norma do “acordo”.

            Como profissional, necessito de encontrar essa solução.

            Como pessoa, passa-me ao lado se o acordo é bom ou mau.
            (tem defeitos, claro que tem e muitos, tal como tudo o que os seres humanos fazem neste planeta – até agora não vi uma coisa só feita por seres humanos que possa ser considerada sequer próxima do “perfeito”.)

            Sobre o italiano, se é uma “espécie” de esperanto da península itálica, então ainda tiro mais o meu chapéu aos italianos. É na união que está a força e cá para fora demonstram que conseguiram um compromisso forte para auxiliar na união.

            Bem ou mal, terão conseguido.

            Também presumo que necessitem de fazer melhoramentos constantes.

            (faz lembrar o software!)

            Bom fim de semana.

          2. Perdão, porque só li melhor agora esta sua frase: “Conclui-se então que o objectivo do AO90 não é arranjar uma nova ortografia para o português, mas sim estabelecer uma ortografia para uma nova língua.”

            Permita-me opinar desta forma: A conclusão é sua, e está no direito de a concluir, como é óbvio, mas é impossível concordar consigo.

            Pareceu ser muito conhecedor da língua italiana, mas neste caso, permita-me, espalhou-se…

            A ortografia de 1990 mexe com menos de 2% das palavras da língua portuguesa.

            Isso é suficiente para criar uma nova língua?

            Nota: Não estou a tirar partido pelo acordo de 1990, mas acho que deve existir um mínimo de coerência da sua parte.

          3. Ainda gostaria de saber quem e como se calcularam esses famosos 2% (ou 1.6%, ou até mesmo 0.9% segundo uns e outros).

            São contas feitas a partir do dicionário do Português contemporâneo (Malaca Casteleiro), que devia ter 400 000 palavras, passou a prometer 200 000 e acabou por ser publicado cerca de 110 000? As contas foram feitas apenas para os radicais das famílias de palavras, ou tomaram em conta cada uma?

            É um número que tem sido avançado desde que o assunto veio à baila e, ao contrário do que acontece com outros temas, nunca se percebeu de onde veio. Terá sido simplesmente inventado? Se não foi, por que razão nunca se mencionou qual o universo de palavras usado?

            A questão não é se mexe com poucas ou muitas palavras, é se mexe com palavras de uso frequente ou infrequente. Se as palavras alteradas forem as que actualmente já se recomendaria usar um dicionário para ter a certeza da sua ortografia, não haveria dano nenhum.

            E há que reconhecer que uma união ortográfica que aumenta o número de palavras diferentes entre as duas normas ortográficas anteriores não se pode chamar exactamente uma união. Que união ortográfica digna desse nome separa palavras que se escreviam de igual forma?

            Quanto à minha coerência ou falta dela, tomo o partido pela norma ortográfica prevista pela legislação da República Portuguesa, pois os decretos-Lei que regem o AO45 estão em pleno vigor e têm precedência jurídica formal sobre resoluções da Assembleia da República.

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